ArtRio 15a. edição | 10 a 14 de SETEMBRO de 2025 | MARINA DA GLÓRIA ArtRio 15a. edição | 10 a 14 de SETEMBRO de 2025 | MARINA DA GLÓRIA

Entrevista com Maxwell Alexandre, artista participante do SOLO

17/07/2019 - Por ArtRio

Quando foi que se descobriu artista? Consegue descrever um momento catártico onde percebeu que aquele viria a ser efetivamente seu ofício?

Eu desenho desde pequeno, minha mãe sempre me disse que esse era o dom que Deus havia me dado. Quando você desenha “bem”, ainda na infância, os adultos te classificam como artista e te chamam assim. Mas a medida que fui crescendo o entendimento do que era arte foi ficando amplo demais, pois um ator de novela, um cartunista, cantor ou ilustrador são entendidos como artistas também. A noção e distinção de um artista plástico em relação aos demais, e mesmo o conhecimento da arte contemporânea como um campo exclusivo só chegou a mim aos 22 anos no terceiro período de minha graduação em comunicação visual. Precisamente quando passei a ter aulas de plástica em um curso com o pintor Eduardo Berliner. Ele era muito rigoroso ao avaliar os trabalhos e perguntava sobre a escolha do formato, do material de tudo. Toda essa indagação me fez ir muito além em meu processo criativo. Eu que havia ingressado na academia com a finalidade de me formar em design gráfico, encontrei neste curso uma janela muito mais ampla e que comportava toda a fragmentação de minha prática, uma vez que eu já lidava com fotografia, desenho, serigrafia, vídeo entre outras mídias.

Existe alguma figura que é sua maior referência no mundo das artes? Se sim, qual é e por quê?

Eu mesmo. Se for pra escolher, apenas um, como a maior referência, eu teria que pôr em conflito várias figuras chave para minha formação o que acho desinteressante nesta ocasião.

Qual a função da arte para você?

Acredito que a arte tenha várias funções, mas gosto muito da ideia da arte como uma disfunção.

Qual sua opinião geral sobre o comportamento do mercado da arte hoje em dia? Se pudesse mudar algo no ciclo do mercado, o que seria?

Minha resposta pode ser leviana, uma vez que ainda vou completar dois anos trabalhando como artista profissional integrado ao circuito e mercado de arte. É tudo muito recente pra mim. Mas penso que o mercado não tem compromisso, necessariamente, com a qualidade do trabalho de arte, é sobre outros pactos e interesses turvos que os artista não tem controle.

Eu tive sorte de trabalhar no início com A Gentil Carioca, que é uma galeria que atua muito internacionalmente, fazendo feiras e construindo pontos de contato com agentes globais do sistema, então em pouco tempo nossa parceria funcionou para expandir o trabalho para lugares de bastante prestígio, ajudando a construir meu mercado fora do Brasil. Para além da galeria eu pude contar com uma grande patrona das artes, a Frances Reynolds e sua instituição, a Inclusartiz que vem acompanhando e dando suporte a minha pesquisa. Nesse processo fiz duas residências, a primeira em Londres na consagrada Delfina Foundation e depois no Museu de Arte Contemporânea de Lyon, que culminou em minha primeira mostra solo internacional. Pra fechar essa lista, eu e A Gentil Carioca acabamos de apresentar um projeto na Art Basel que foi destaque entre os stands da feira. Essa sequência de experiências fora do país me fez entender que o mercado no Brasil é um universo paralelo. Um artista relevante aqui pode ser um desconhecido ao cruzar a fronteira.

Desde o início eu achava curioso o fato de artistas brasileiros não conseguirem atingir as cifras milionárias no mercado internacional, hoje penso que estar na América Latina é uma desvantagem nessa relação de capital financeiro. Somos prejudicados geograficamente neste sentido, não importa se um artista brasileiro tem um currículo invejável que contemplem exposições internacionais institucionais, bienais ou grandes coleções… Um artista americano ou europeu com um currículo menor vai ter mais valor especulativo.

Existem várias coisas que eu gostaria de mudar no mercado, mas o valor da arte brasileira é uma reivindicação que está para além de cifras, é uma questão de poder.

Poderia contar um pouco sobre a sua pesquisa e prática?

Essa pergunta é muito abrangente, então vou usar a questão como uma oportunidade de compartilhar uma carta de intenção que fiz em 2016 para um edital que contemplava uma residência no Museu do Bispo do Rosário.

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Sou um jovem ambicioso, sinto que preciso dedicar tudo que tenho agora em minha produção. Fico agoniado ao me deparar com situações de trabalho onde é preciso cumprir expedientes de 8 horas por dia. Por isso vivo uma dicotomia entre tempo livre para produção e o mínimo de dinheiro possível para garantia de coisas básicas, tentando protelar o máximo um emprego formal que possa até me garantir um bom salário. Busco não me render a este sistema, a esta pressão social. Neste momento, penso que tempo e dinheiro são o mesmo. Abdicar de grana, sempre, em detrimento mínimo de minha produção tem sido uma resistência necessária. Pouca dinheiro, mas muito tempo livre para divagar, vadiar, observar e produzir. Assim como Bispo, tenho um contato diário com a minha obra, não vivo disso, mas vivo pra isso.

Arte pra mim não é só um capricho, é uma vocação, não me vejo em outra situação a não ser neste estado. Sonho com o dia em que vou acordar e tudo que vou precisar fazer é o que já venho fazendo. Quero viajar o mundo num diálogo incessante com as pessoas, com os grandes artistas e instituições. Esta residência é uma grande chance que tenho de mostrar meu potencial, de conhecer mais sobre o grande Arthur, cuja obra dialoga com a minha, até mesmo na questão patológica, vista por muitos como uma conexão necessária para que a arte aconteça. Em minha prática sempre fui tido como louco pelas pessoas que me viam fazendo manobras com Patins Street pelas ruas. Hoje essa visão foi potencializada, uma vez que continuo a fazer as mesmas manobras, só que agora com tinta nos pés. Reiterando, sou louco duas vezes.

Estou no meu último período de faculdade, e meu TCC é sobre esta proposta que apresento à Instituição. Esta é a grande chance que tenho de juntar minha vida acadêmica com meu trabalho mais potente no momento. Poder levar isso à uma imersão, em um terreno inédito pra mim, é promissor. Sei que a Colônia abriga uma diversidade de convivência entre construções coloniais e prédios históricos, um grande numero de moradia, onde passado e presente se encontram. Todas essas questões peculiares do próprio lugar é matéria-prima riquíssima para o desdobramento de um trabalho em artes que é geográfico, que fala justamente da afirmação de território e versatilidade.

Pode ter certeza que o volume de materiais gerados nesta imersão, tanto quanto livros de artistas, desenhos descompromissados, fotografias, vídeos, qualquer tipo de anotação junto da obra principal vai trazer uma riqueza de outra ordem para todas as partes envolvidas: comunidade, instituição e indivíduo. Tô pronto!

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